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Com Selic em queda, seguradoras partem para crédito privado



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A taxa de juros básica (Selic) em queda vai obrigar as seguradoras a acelerarem mudanças nas suas políticas de investimento. Os resultados financeiros das companhias, que em alguns casos é até superior ao resultado com as operações de seguros, devem encolher com a taxa de um dígito. A ordem do dia, portanto, é diversificar as aplicações financeiras e melhorar a eficiência com as operações de seguros.

No cardápio de investimentos, hoje dominado por títulos públicos, ganham espaço os papéis de crédito privado, como CDB, letras financeiras e debêntures. Também já despontam iniciativas em investimentos mais estruturados, como fundos de private equity - que compram participação em empresas. "Num ambiente de juros menor, no curto prazo teremos que mudar o mix de investimentos, mas no longo prazo tem que compensar no operacional mesmo", alerta Marcelo Picanço, diretor financeiro da Porto Seguro.
Entre as maiores seguradoras do país, a Porto ilustra bem a dependência da linha financeira no lucro da companhia. Em 2010, o resultado operacional foi de R$ 196,1 milhões e o resultado financeiro, de R$ 709,72 milhões. Em 2011, porém, a competição acirrada no ramo de automóveis e a inflação de custos alargou ainda mais a distância entre os dois. Enquanto o resultado financeiro foi de R$ 870 milhões, a seguradora teve prejuízo operacional de R$ 74,1 milhões (veja o caso de outras seguradoras no quadro acima).
O mercado de seguros somou R$ 81,7 bilhões em provisões técnicas até maio de 2011, último dado disponível pela Superintendência de Seguros Privados (Susep). Provisão técnica é a reserva feita pela seguradora para pagar indenizações, que é aplicada em determinados ativos financeiros (chamados de ativos garantidores) de acordo com as regras estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) - veja quadro com as principais regras nesta página. Além disso, há o caixa livre das seguradoras que também é aplicado e entra na conta dos resultados financeiros, mas não precisa seguir as regras da Susep.
Até março, 25% dos recursos estavam aplicados diretamente em títulos públicos, 74% em renda fixa e o restante, dividido entre imóveis e ações. Ao todo, as seguradoras detém 4,2% da dívida pública federal, algo em torno de R$ 73,1 bilhões, segundo dados do Tesouro Nacional de janeiro de 2012. Desse valor, 55,3% estão aplicados em papéis atrelados à índices de preços, 25,5% em taxa flutuante e 19,2% são pré-fixados.
Na Allianz, em que mais de 95% do R$ 1,7 bilhão que a empresa aplica estão hoje alocados em dívida pública, a estratégia para sobreviver à Selic em queda envolveu até renegociar as limitações de investimentos impostas pela matriz. A seguradora estima entre R$ 7 milhões e R$ 9 milhões a perda com a queda dos juros, caso mantivesse os investimentos que tinha no meio de 2011 na carteira, afirma Jose Garcia Naveros, diretor financeiro da seguradora.
  
Para contornar a perda com a Selic, a Allianz tomou duas medidas. Primeiro, renegociou a duração dos papéis na carteira, que subiu de 1,7 ano para até 2,2 anos. Segundo, vem discutindo com a matriz aumento dos limites de aplicação em crédito privado na política de investimentos da companhia. Em média, a empresa aplica 3% de seus recursos em papéis privados, o que deve subir para 5% ainda neste ano.
Com as mudanças, Garcia acredita que a Allianz não precisará compensar perdas no seu resultado financeiro com o operacional. "Mesmo porque, estamos nos preparando para ser mais agressivos em algumas linhas neste ano", afirma. Isso só será possível, porém, porque a seguradora vem apresentando bons resultados nos últimos anos, o que dá espaço para redução de preços nesse ano.
O discurso da Allianz, porém, vai na contramão do que promete o mercado. "Em 2012 o mercado de seguros como um todo deve ficar mais conservador", diz Arthur Farme d'Amoed Neto, vice-presidente corporativo e de relações com investidores da SulAmérica. "Erros na formação de preços dos seguros não serão compensados pelo ganho no resultado financeiro, como aconteceu com algumas empresas no ano passado."
Para Francisco Galiza, da consultoria Rating de Seguros, as seguradoras terão que ajustar os preços para cima para manter a rentabilidade. "É uma balança, se resultado financeiro cai o operacional tem que subir", explica.
Para compensar a queda dos juros, as companhias terão que buscar aplicações de maior risco. Com R$ 8,2 bilhões aplicados (sendo R$ 6,1 bilhões recursos de seguros), a Porto planeja aumentar sua exposição em crédito privado para até 25% da carteira em dois anos. Hoje, a seguradora aplica 14% dos ativos em crédito privado, sendo que há um ano esse percentual era de 6%. A aplicação em ações deve aumentar um pouco, mas vai depender do cenário, segundo Picanço.
No ano passado, a seguradora aplicou em um fundo de private equity que compra participação em empresas de varejo e serviços. Picanço não revelou o valor aplicado, mas o último balanço da seguradora mostra que foram investidos R$ 19,9 milhões em fundos de participações em 2011. Segundo o diretor financeiro, a seguradora continua de olho em oportunidades de aplicação nesses fundos, mas eles não devem ganhar muito espaço no portfólio, por causa da necessidade de liquidez que os investimentos da seguradora demandam.
A SulAmérica, que aplicou R$ 4,8 bilhões em títulos e valores mobiliários em 2011, deve mexer na carteira, mas de forma mais suave. A seguradora já tem 23% de seus ativos em papéis de crédito privado. "Ainda temos espaço para aumentar, porém gradualmente", afirma Farme. Ano passado, 65% dos investimentos da companhia estavam em papéis atrelados à Selic e ao CDI.
Com o maior volume de provisões do mercado, o Grupo Bradesco Seguros não planeja mexer nos investimentos por ora, mas sim compensar a perda de receita financeira com eficiência operacional. "Ao mesmo tempo que diminui os ganhos financeiros, a queda da Selic impulsiona a economia e consequentemente a compra de seguros. Com isso, compensamos no volume de vendas", diz Roberto Chamberlain, diretor do grupo. A Bradesco fechou 2011 com R$ 112 bilhões em ativos investidos, sendo R$ 90 bilhões de provisões de previdência, R$ 8 bilhões de seguros e R$ 4,5 bilhões de capitalização.
"Não acho que já nesse ano veremos uma mudança significativa na alocação dos ativos garantidores. Mas acho que mais cinco anos nessa situação e sentiremos isso", avalia Alexandre Henriques Leal Neto, superintendente de regulação da Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg).

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