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Pacto de permanência no direito do trabalho



Por Eduardo T. Carvalho
A prática das empresas de ajudarem seus empregados, a fim de obterem uma melhor qualificação profissional é cada vez mais comum nos dias atuais.
Todavia, a legislação trabalhista brasileira não acompanhou tal evolução e esse mecanismo de patrocínio de cursos e aperfeiçoamento de empregados não está regulamentado pelas leis brasileiras. Esse atraso na legislação, em relação a outros países, pode acarretar diversos problemas nas relações de emprego, uma vez que as empresas podem deixar de qualificar seus funcionários, imaginando que perderão o investimento.

Há algumas alternativas para que esse problema seja resolvido sem que sejam violados a Constituição Federal, o direito à liberdade e o princípio da livre iniciativa destes funcionários, os quais recebem tais benefícios.
Entre essas alternativas estão as cláusulas especiais do contrato de trabalho, por exemplo, a cláusula de permanência, a qual a empresa que concede a seu empregado o custeio de especializações ou cursos de aperfeiçoamento técnico para melhor qualificar a mão de obra, pode exigir, em contrapartida, que este funcionário permaneça trabalhando durante um período que faça jus ao investimento feito.
Essa limitação destina-se a garantir que o contrato dure o tempo suficiente para que as despesas efetuadas pelas empresas fiquem compensadas. Vale lembrar que tais despesas terão de ser extraordinárias, ou seja, um benefício, para que não caiam no âmbito das despesas obrigatórias e comuns a todos funcionários.
A limitação destina-se a garantir que as despesas da empresas fiquem compensadas
As empresas têm grande interesse em investir nos seus empregados em vez de contratar terceiros que não integram seu quadro funcional, em virtude de já existir um vínculo empregatício. Assim, no caso de o trabalhador romper o contrato no âmbito do limite temporal a que se obrigou, terá que pagar o montante correspondente às despesas suportadas. Esse montante é proporcional ao tempo que faltava para findar o respectivo contrato de trabalho.
Entretanto, utilizando-se do direito comparado, na Espanha, o empregado que tenha se beneficiado de especialização profissional custeada pelo empregador, não poderá pedir demissão pelo prazo máximo de dois anos, indenizando a empresa se não respeitar esse pacto. Existem alguns casos concretos que ultrapassam, inclusive, o foco do pedido de demissão e admitem que a indenização seja devida até mesmo nos casos de dispensa por justa causa. O que é justo.
Por outro lado, por óbvio, na ocorrência dos casos que a empresa dispensa o empregado ou ocorre uma rescisão indireta, a respectiva multa compensatória não é devida.
Há juristas que entendem possível a aplicação dessa norma pelo intérprete brasileiro, ante a omissão do ordenamento trabalhista brasileiro, prevista no art. 8º da CLT. Igual solução há de ser dada em relação ao valor do reembolso correspondente ao aperfeiçoamento conferido ao empregado. Tanto na Espanha, quanto no Brasil, o ressarcimento deve guardar proporcionalidade com os seus ganhos habituais.
Para que a cláusula de permanência seja válida, alguns doutrinadores dizem que o simples ajuste verbal parece suficiente, ante ao princípio da liberdade de forma consagrado pela CLT.
Ocorre que se trata de uma cláusula excepcional, pois restringe o direito potestativo do funcionário de se desligar da empresa. Portanto, é recomendável que, para maior garantia das empresas, a forma acordada seja por escrito.
Essa falta de previsão da cláusula de permanência é um problema para as empresas, tendo em vista a falta de segurança em realizar investimentos no quadro operacional. Muitas vezes o funcionário, após ser preparado por determinada empresa, é assediado pelos concorrentes, fazendo-o desvincular-se de quem patrocinou a especialização. Tal fato fere não só o direito da empresa, mas o direito econômico como um todo, pois se faz desse investimento algo pessoal e não em prol da coletividade e das corporações, pois para estas é importante um maior investimento na mão de obra, aumentando o desenvolvimento de vários setores que carecem de trabalhadores experientes e capazes de exercer suas atividades com eficácia.
Para a segurança da empresa, esta deve sempre estar atenta para informar ao funcionário, de forma clara e objetiva, a peculiaridade do pacto laboral que está sendo firmado, bem como discriminar a totalidade dos gastos com a especialização. Isso porque, caso o empregado desvincula-se do trabalho, o empregador poderá cobrar não só a multa prevista, mas todos os gastos despendidos.
Existem empresas aplicando a cláusula de permanência nos contratos de trabalho, quando o investimento se faz necessário. A segurança jurídica que elas estão encontrando é baseada em decisões como, por exemplo, a exarada pelo TST que diz que "é harmônica com a legislação vigente e com os princípios de direito do trabalho - da realidade e da boa-fé a cláusula consubstanciando a obrigação de o empregado permanecer na empresa, por período limitado de tempo, após a feitura de curso custeado por esta, ou de reembolsá-la das despesas realizadas".
Portanto, conclui-se que não há qualquer ilegalidade na concessão de empréstimo para financiar a especialização ou estudos do empregado, muito menos condicionar a anistia à permanência do empregado na empresa, por determinado tempo, fato este que não torna a cláusula de permanência abusiva.
Por fim, a cláusula não é só um mecanismo de proteção da empresa em relação ao empregado é muito mais que isso, com isso se pode perceber que o pacto de permanência é um mecanismo que protege também o direito econômico, pois assegura às empresas a melhor qualificação de seus funcionários e um investimento assíduo na própria mão de obra.
Eduardo Teixeira de Carvalho é especialista em direito empresarial pela FGV. Sócio do escritório Ricardo Trotta Sociedade de Advogados
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
 
 
Fonte: Valor Econômico

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